Um empresário de 39 anos, morador de Cachoeiro de Itapemirim, no sul do Espírito Santo, é suspeito de vender armas de forma ilegal além de documentos falsos de autorização de porte no valor de R$50 mil. A maior parte das armas eram vendidas para milicianos do Rio de Janeiro e suspeitos com passagem pela polícia no estado. O empresário está preso.
De acordo com a Polícia Civil do Espírito Santo (PCES), a prisão aconteceu por meio da Delegacia Especializada em Armas, Munições e Explosivos (Desarme). Segundo a polícia, em dezembro do ano passado, o suspeito foi preso em flagrante e 48 armas foram apreendidas durante ação no bairro Vila Rica, em Cachoeiro de Itapemirim.
O titular da Delegacia Especializada em Armas, Munições e Explosivos (Desarme), delegado Guilherme Eugênio Rodrigues, relatou que o empresário vendia armas ilegalmente, além de documentos falsos.
"Ele vendia um documento falso que dizia se tratar de um porte nacional de armas no valor de R$ 50 mil. Esse documento alegava que daria ao portador o direito de circular por todo o território na posse de uma arma", relatou.
O delegado ressaltou que um dos compradores desse documento mostrou para os colegas, o que chamou atenção. "Essa pessoa acabou contando vantagem para os colegas, acabou exibindo esse documento para os colegas dizendo que ele agora podia andar armado. E os colegas dele fizeram então contato com a Desarme, que por sua vez interveio o documento ao exército, que por sua vez constatou a falsidade do documento e deu início a ação de fiscalização, em meio a qual todas essas irregularidades foram sendo, pouco a pouco, reveladas", esclareceu.
Guilherme Eugênio explicou que o empresário falsificou a autorização do Exército Brasileiro para comprar armas de fabricantes legais. "Ele falsificou o direito de importar, que ele não tinha. Simulou a aquisição do direito de importar essas armas, da aquisição do direito de conceder treinamento, de alguns outros direitos dos quais ela dispunha. E, paralelamente a isso, ela criou uma forma de justificar que essas armas deixassem o estoque", explicou.
Ainda de acordo com o titular da Desarme, a loja de armas no Brasil precisa justificar cada saída. "É necessário ter o controle de estoque fiscalizado pelo Exército, pela Polícia Federal. E ela tem que mostrar para quem foi destinada cada uma das armas que ele adquiriu. E ela montava pastas, por meio das quais ela justificava que as armas foram vendidas. Ele (empresário) fazia isso apresentando documentos que nessas pastas eram inseridos com a Polícia Federal, mas eram documentos falsos", disse o delegado.
Rodrigues relatou que o empresário acreditava que conseguiria enganar a polícia. "Ele acreditava que seria capaz de convencer o Exército e a polícia de que ele mesmo não sabia que os documentos eram falsos e ele acreditava que se fosse preso ele poderia driblar a investigação. Por isso, houve a necessidade de uma investigação mais profunda. Uma simples fiscalização militar talvez não fosse profunda o suficiente para que esse esquema fosse revelado", afirmou.
Armas eram vendidas para milicianos
O titular da Desarme informou ainda que o empresário vendia armas para todos os públicos, mas em sua maioria, pessoas com passagem pela polícia e milicianos no Rio de Janeiro.
"A maioria dos compradores dessas armas ilegais tinham antecedentes criminais. Ele tinha clientes no Espírito Santo, Rio de Janeiro, São Paulo e Santa Catarina. Muitos deles foram efetivamente presos em algum momento. Entre os espírito-santenses presos, predominam suspeitos com porte ilegal de armas, pessoas que foram presas mais vezes, posse ilegal de armas, ou por recepção de produtos roubados", explicou.
O delegado ressalta que no Rio de Janeiro as armas eram voltadas para milicianos. "Os adquirentes dessas armas eram predominantemente milicianos, pessoas que já foram presas sob a acusação de se dizerem policiais e promoverem a extorsão a comerciantes na condição de milicianos".
Guilherme Eugênio destacou que um desses milicianos atuava com um dos mais procurados do Rio de Janeiro. "Um desses compradores em particular chamou a atenção por haver sido preso no mesmo processo que gerou a prisão de um dos milicianos mais famosos do estado do Rio de Janeiro, mais temidos no estado, chamado naquele estado de Orlando Curicica", declarou.
Loja estava em nome de funcionário
O delegado contou que a loja foi originalmente constituída em nome de um jovem que à época não havia completado 25 anos. "Uma pessoa menor de 25 anos não tem o direito de possuir armas de fogo no Brasil e, por isso, recentemente o Exército Brasileiro impôs ao empresário a transferência da titularidade da empresa. Quando nós conhecemos aquele que originalmente figurava como dono da loja, constatamos que na verdade ele era um empregado de fato, ele não ganhava direitos trabalhistas, mas recebia um salário mínimo e promovia a limpeza do estabelecimento e eventualmente trabalhos de menor complexidade como a recepção de clientes ou polimento de armas customizadas", disse Rodrigues.
O jovem, que tinha a loja em seu nome, não entendia o esquema. "Ele era uma pessoa bastante simples que foi escolhido porque não tinha condição, ao nosso ver, de entender as atividades empreendidas pelo empresário. E essa loja, embora constituída há pouco mais de um ano".
Banco alertou sobre lavagem de dinheiro
O empresário, dono da loja, possuía contas em 73 instituições bancárias. Uma delas alertou à polícia sobre possível lavagem de dinheiro. "Uma dessas 73 instituições reportou suspeitas ao Coaf, que é o Conselho de Controle de Atividades Financeiras, órgão federal que trabalha para coibir a lavagem de dinheiro. Essa notificação ao Coaf, feita por um desses bancos, mostra que esse empresário vinha movimentando montantes de dinheiro absolutamente incompatíveis com o faturamento que ele havia declarado. Ele declarou ao banco ter um faturamento bruto de 17 mil reais por mês, mas movimentou em aproximadamente nove meses quase um milhão de reais".
Para não chamar a atenção, o homem fazia utilização de laranjas, explicou o delegado. "Ele transferia dinheiro para laranjas e, depois, esses laranjas faziam transferências desse dinheiro para terceiros".
Empresário comprou fuzil usado por forças de segurança
O titular da Desarme evidenciou ainda que o empresário fraudou a compra de um fuzil de alto calibre. "É um fuzil 556, uma arma de assalto do mesmo padrão das armas mais poderosas usadas pelas polícias civil e militar do estado. Esse fuzil foi adquirido de forma legal, por um homem de bem e, posteriormente, vendido para o lojista que apresentou documento falso. Ele enganou o vendedor, simulou a transferência desse fuzil para o nome dele e o titular definitivo dessa arma se encontrava relativamente tranquilo, acreditando que a venda havia sido legal. Foi informado ao Exército Brasileiro e, na verdade, a arma legalmente ainda pertencia ao vendedor. Isso colocava o dono legal em risco. Ele poderia até mesmo ser tido como suspeito por um crime que viesse a ser praticado com o emprego dessa arma, que oficialmente constava nas bases de dados do exército", explicou.
Empresário acima de suspeita
O delegado salientou que o empresário tinha uma boa reputação onde vivia e era conhecido. "Ela era uma pessoa muito conhecida, como por exemplo, em todos os clubes de tiro, todos os estabelecimentos legais destinados à venda de armas. Ele promovia a manutenção de armas de fogo e a customização, ou seja, o incremento estético dessas armas. Então, poucas pessoas desconfiavam dele em Cachoeiro de Itapemirim. Ele tinha contato com muitas pessoas de bem, que inclusive confiaram nele", comentou Rodrigues.
Guilherme Eugênio finalizou dizendo que o empresário vai responder 35 vezes por comércio ilegal de arma de fogo (crime hediondo), posse ilegal de arma de uso restrito, lavagem de dinheiro e estelionato.
Delegado faz alerta
O titular da Delegacia Especializada em Armas, Munições e Explosivos alertou que todos os documentos que permitem a circulação de armas são expedidos pelo 38° Batalhão de Infantaria do Exército Brasileiro. Além disso, para conseguir o documento que permite a posse e o porte de armas, é necessário cumprir uma série de requisitos.
"Não é fácil e não é qualquer pessoa que consegue esse documento de permissão. Entre os requisitos, o interessado precisa ter idade superior a 25 anos. Se for uma aquisição pela Polícia Federal, ele precisa provar uma justa necessidade. Se for uma aquisição pelo Exército, ele tem que comprovar que ele é um colecionador, caçador ou atirador esportivo autorizado. É necessário comprovar que participa de competições, mostrar que tem condição financeira de participar de campeonatos, que são caros, enfim. Há uma série de requisitos necessários para uma aquisição legal", explicou.
O delegado finalizou deixando um recado. "Todos os documentos que alegadamente teriam sido emitidos pelo Exército Brasileiro em favor de cidadãos do Espírito Santo, que não tenham sido expedidos pelo 38º Batalhão de Infantaria, são falsos. Qualquer possuidor de arma de fogo que se acredite caçador, colecionador ou atirador esportivo autorizado para tanto e que tenha uma autorização emitida por alguma unidade militar que não seja o 38º BI, deve procurar a Desarme para entregar essa arma e se regularizar de modo a impedir sua prisão em flagrante", completou.
ES Hoje