Com aumento de quase 50% no último ano, o preço do azeite no Brasil levou comerciantes a trancarem os produtos a chave e a colocarem lacres antifurto nos recipientes. Especialistas dizem que a instabilidade deve se manter por pelo menos dois anos.
Quarta maior inflação acumulada nos últimos 12 meses, a alta do preço do azeite de oliva no último ano bateu 49,42%, segundo dados do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) para maio. A variação só está atrás da registrada pela cebola (86,13%), tangerina (58,02%) e batata-inglesa (57,94%). Para se ter uma ideia, o índice geral da inflação acumulou alta de 3,93% no mesmo período.
Em meio a esse cenário, mercados das redes Extra e Pão de Açúcar passaram a usar lacres antifurto nos recipientes de azeite na capital paulista para evitar prejuízos. A orientação veio da direção da franquia há cinco meses, segundo funcionários. No começo, apenas os produtos mais caros eram lacrados. Hoje, todas as garrafas de vidro recebem o artigo de prevenção.
Em um mercado em Ipanema, na zona sul do Rio de Janeiro, por sua vez, garrafas de azeite passaram a ser trancadas a chave. Para comprá-las, é preciso chamar um funcionário.
O Brasil consome cerca de 100 milhões de litros de azeite por ano. A produção nacional corresponde a 0,6% dessa demanda, em torno de 600 mil litros, segundo o Ibraoliva (Instituto Brasileiro de Olivicultura). Devido à baixa produção, o mercado doméstico é dependente de importações e suscetível a instabilidades externas.
A variação de preços do azeite está se deve à terceira estiagem consecutiva na Espanha, maior produtor mundial de óleo de oliva. Supermercados do país europeu também estão trancando, com correia, chave e cadeado, os vidros do produto.
Para Renato Fernandes, presidente do Ibraoliva, o cenário externo deve se manter no curto prazo. "Não acredito em redução do preço do azeite nos próximos dois anos. Os estoques estão baixíssimos".
De acordo com Fernandes, a região sul do Brasil tem um clima favorável para a produção de azeite, mas há uma "questão cultural" por trás da dependência estrangeira. "Temos a tradição de importar azeite europeu desde o Brasil colônia". A tendência, no entanto, mudou nas últimas duas ultimas décadas. A expectativa é que a produção nacional ocupe cada vez mais esse protagonismo no Brasil, afirma.
Do outro lado, bares e restaurantes têm amargado prejuízos. Joaquim Saraiva, diretor da AbraselSP (Associação Brasileira de Bares e Restaurantes de São Paulo), afirma que os negócios não estão repassando a variação para o cardápio para os clientes.
"Existem pratos nos quais o azeite não pode ser substituído. O restaurante não vai mudar a receita. Há, contudo, uma criatividade para substituir o azeite", diz ele. Apesar disso, há quem consiga improvisar. Saraiva dá o exemplo de restaurantes que em vez de temperar a salada com azeite utilizam uma composição com limão e outros ingredientes.
Mikaela Paim, sommelière de azeites, alerta para a falsificação dos produtos. "Empresas clandestinas, em busca de lucro fácil, frequentemente utilizam óleos não comestíveis, como o lampante (usado como combustível para lamparinas), para adulterar o azeite de oliva, colocando em risco a saúde da população".
Paim diz que para saber se o produto é falsificado o consumidor pode sentir o cheiro e prová-lo. O azeite é produzido a partir de azeitonas frescas, logo tem cheiro semelhante ao fruto. O lampante, por outro lado, é caracterizado por alta acidez, sabores estranhos e impurezas.
A especialista também alerta para os produtos que são vendidos como alternativa de preço mais acessível. "O mais indicado é o consumo de azeite extra virgem. É importante olhar a composição no rótulo, óleos mistos ou compostos de soja certamente serão de baixa qualidade e não trarão benefícios à saúde", afirma Mikaela.
FELIPE BRAMUCCI E ARTHUR GUIMARÃES