O Superior Tribunal de Justiça (STJ) alterou, neste mês, o entendimento sobre o rol de procedimentos listados pela Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) para a cobertura dos planos de saúde.
A decisão abarca a cobertura de exames, terapias, cirurgias e fornecimento de medicamentos, por exemplo.
A administradora Alessandra Santos da Silva Resende, mãe de um menino autista de 12 anos e moradora de Vila Velha, na Grande Vitória, falou que já era difícil manter um plano de saúde antes da mudança e que agora a situação de mães como ela ficam ainda mais complicadas.
"Aí a gente vai paga um plano de saúde, faz sacrifício pra manter um plano de saúde porque gente, eu conheço pessoas nessa minha vivência de 10 anos de terapia do meu filho, conheço pessoas que praticamente deixam de comer pra pagar o plano de saúde pra criança não ficar sem a terapia", contou.
Ela teme pelo que pode acontecer com crianças como o filho dela.
"Agora eu fico pensando: o que vai ser dessas crianças? O que vai ser dessas crianças que já estão na fila esperando surgir vaga para poder fazer uma terapia? Isso pelo plano gente, tô falando pelo plano. Será que a pessoa acha que uma pessoa com câncer vai ter tempo pra judicializar o processo pra começar o tratamento? Será que a pessoa não vê que uma criança com autismo precisa de terapia pra ontem?", disse.
Outra capixaba, também mãe de criança autista, a arquiteta Ana Paula Fink, que tem uma menina autista de seis anos, disse que, além das terapias, se preocupa também com tratamento em home care.
"No dia eu estava acompanhando pelo Twitter a votação e estava na terapia com a minha filha. Lembro que saí de lá pensando 'quando vai ser a última vez que vou trazer minha filha aqui?' Terapias são muito caras para pagar particular, né? E hoje nenhuma das terapias dela é coberta. Mas vai muito além, porque não só só as terapias das crianças com autismo, também temos home care. Teve algumas notícias de planos querendo retirar a ventilação mecânica em casa, oxigênio móvel. Então, são coisas que influenciam a vida diretamente das pessoas", explicou.
O que estava em julgamento?
O STJ deveria decidir se o rol de cobertura dos planos é exemplificativo ou taxativo.
A cobertura exemplificativa significa que os planos de saúde não se limitam a cobrir apenas o que está na lista da ANS, pois ela serve exatamente como exemplo de tratamento básicos.
Já a cobertura taxativa entende que o que não está nesta lista preliminar da ANS não precisa ter cobertura das operadoras.
Como era até agora?
A lista da ANS era considerada exemplificativa pela maior parte do Judiciário. Isso significa que pacientes que tivessem negados procedimentos, exames, cirurgias e medicamentos que não constassem na lista poderiam recorrer à Justiça e conseguir essa cobertura. Isso porque o rol era considerado o mínimo que o plano deveria oferecer.
Os planos, assim, deveriam cobrir outros tratamentos que não estão no rol, mas que tenham sido prescritos pelo médico, tenham justificativa e não sejam experimentais.
Assista ao vídeo: Planos de saúde não precisam cobrir procedimentos fora da lista da ANS
O entendimento do STJ é de que o rol é taxativo. Com isso, essa lista contém tudo o que os planos são obrigados a pagar: se não está no rol, não tem cobertura, e as operadoras não são obrigadas a bancar.
Com a mudança, as decisões judiciais devem seguir esse entendimento – de que o que não está na lista não precisa ser coberto. Nesse caso, muitos pacientes não conseguirão começar ou dar continuidade a um tratamento com a cobertura do plano de saúde.
A decisão do STJ não obriga as demais instâncias a terem que seguir esse entendimento, mas o julgamento serve de orientação para a Justiça.
Mas há, ainda, uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) em tramitação no Supremo Tribunal Federal que pode mudar o entendimento do STJ.
O que está no rol da ANS?
A lista de cobertura pode ser consultada aqui. Ela depende, no entanto, do tipo de cobertura contratada: ambulatorial, internação, parto e odontológico, além das combinações entre esses tipos.
Quais procedimentos perdem a cobertura dos planos de saúde?
O rol da ANS é básico e não contempla muitos tratamentos, como medicamentos aprovados recentemente, alguns tipos de quimioterapia oral e de radioterapia, e cirurgias com técnicas de robótica, por exemplo. Como o rol é taxativo, os planos ficam isentos da obrigação de bancar esses tratamentos.
Além disso, a ANS limita o número de sessões de algumas terapias para pessoas com autismo e vários tipos de deficiência. Muitos pacientes precisam de mais sessões do que as estipuladas para conseguir resultado com essas terapias, por isso, no atual modelo, conseguem a aprovação de pagamento pelo plano de saúde.
Há exceções?
O entendimento do STJ é de que a lista, embora taxativa, admita algumas exceções, como terapias recomendadas expressamente pelo Conselho Federal de Medicina (CFM), tratamentos para câncer e medicações "off-label" (usadas com prescrição médica para tratamentos que não constam na bula daquela medicação).
Se não houver um substituto terapêutico ou depois que os procedimento incluídos na lista da ANS forem esgotados, pode haver cobertura de tratamento fora do rol, indicado pelo médico ou odontólogo assistente.
Para isso, no entanto, é preciso que:
- a incorporação do tratamento à lista da ANS não tenha sido indeferida expressamente;
- haja comprovação da eficácia do tratamento à luz da medicina baseada em evidências;
- haja recomendação de órgãos técnicos de renome nacional, como a Conitec e a Natijus, e estrangeiros;
- seja realizado, quando possível, diálogo entre magistrados e especialistas, incluindo a comissão responsável por atualizar a lista da ANS, para tratar da ausência desse tratamento no rol de procedimentos.
G1