Enquanto o preço da refeição aumentou 21% entre 2019 e 2022, segundo pesquisa da consultoria, o valor do salgado teve alta de 10%
Na última quarta-feira (8) o comerciante Cícero Severiano Ribeiro, de 50 anos, parou na hora do almoço num trailer que vende salgados no terminal de ônibus da Vila Mariana, na zona sul de São Paulo. Pediu um salgado, um suco e gastou R$ 6. "Adoro comer essa coxa (creme) de frango."
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Além de o comerciante ser atraído pelo sabor do salgado, ele conta que vem mudando os hábitos. Duas a três vezes na semana, almoça o tradicional prato feito, mas nos demais dias opta por um salgado e um suco. Antes da pandemia, ele comia arroz com feijão todo dia. A mudança ocorreu por causa da correria do dia a dia e, principalmente, para economizar. "Os tempos se tornaram mais difíceis."
A conta de quanto Ribeiro economiza ao almoçar um salgado é simples. Um prato feito, com arroz, feijão e carne, por exemplo, não sai por menos de R$ 25 na região onde trabalha. Essa cifra equivale ao desembolso de três dias almoçando salgado e suco.
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No ano passado, os brasileiros que vivem nessas regiões consumiram 170 milhões a mais de salgados prontos, como quibe, coxinha, pão de queijo, pastel, por exemplo, em relação a 2019, antes da pandemia. Em contrapartida, o consumo de refeições, com arroz, feijão, carne, por exemplo, diminuiu em 247 milhões de unidades na mesma base de comparação.
Para chegar ao número de unidades, que expurga o efeito da inflação, a consultoria monitorou diariamente, por meio de aplicativo, o consumo de alimentos e bebidas fora de casa de 4 mil adultos. Eles representam o comportamento de 48 milhões de pessoas que vivem nas regiões metropolitanas de São Paulo, Rio, Recife, Salvador, Fortaleza, Curitiba e Porto Alegre.
"O salgado pronto ganhou tanto destaque que se tornou no ano passado o segundo alimento mais consumido fora de casa e o alimento salgado mais consumido", afirma Hudson Romano, gerente sênior de Consumo Fora do Lar e responsável pela pesquisa.
Em 2019, o salgado ocupava a quarta posição entre os alimentos mais consumidos fora de casa, mas subiu para a segunda colocação em 2022, passando à frente de sanduíches e pizzas, perdendo apenas para os snacks doces que continuaram na liderança nos dois períodos analisados. O salgado pronto e o salgadinho de pacote foram os únicos alimentos fora de casa cujo consumo aumentou no período, com alta de 18% e 4% nos volumes respectivamente. A quantidade consumida de refeições caiu 43%.
"Como o salário médio não cresceu na mesma velocidade de outros custos da alimentação fora de casa, que foram muito fortes, o bolso ficou mais apertado", afirma o consultor. Uma das saída foi deixar de comer pratos com a mesma frequência e colocar os salgados como opção. "Isso não quer dizer que o brasileiro tenha abandonado o restaurante. Mas, se antes comia pratos (prontos) três vezes na semana, agora diminuiu para duas, porque o dinheiro não dá", explica.
Classes de menor renda foram as responsáveis pelo movimento
Artur Almeida, de 24 anos, que ganha um salário mínimo trabalhando com a locação de equipamentos de gaseificação para bares e restaurantes, por exemplo, aponta o preço menor como o principal motivo da troca da refeição pelo salgado, além da economia de tempo. "Acho muito alto um prato de comida por R$ 25 e tem lugares que é bem mais que isso", afirmou ele, enquanto almoçava dois salgados por R$ 10 na última quarta-feira, 7.
Almeida recebe R$ 26 por dia de vale refeição e usa o dinheiro nas compras de supermercado para preparar o jantar e a marmita. "Esta semana não tive tempo de preparar a marmita. Tive de trabalhar no fim de semana, porque o salário não está dando para pagar todas as despesas."
Solmucci explica que o crescimento foi sustentado pelas camadas de renda da base da pirâmide: as classes C, D e E, que ampliaram em 20% as vendas reais de lanchonetes, padarias, por exemplo, muito provavelmente na compra de salgados prontos e lanches.
Em contrapartida, os dados da entidade mostram que os restaurantes do dia a dia que servem refeições, registraram queda real de 10% na receita no período. Ele atribui essa retração também ao home office, adotado pela maioria das empresas em dois dias na semana. Isso teve reflexos no consumo. Já os restaurantes destinados ao público de maior renda "cresceram muito as vendas", diz o presidente da Abrasel, sem revelar os porcentuais.
Compartilhamento e informalidade
O aumento da preferência pelo salgado pronto e pelo consumo compartilhado do item têm transformando o mercado de alimentação fora de casa. Essa mudança também virou uma alternativa de renda para os trabalhadores informais. A pesquisa mostra que o canal de vendas de ambulantes cresceu 45% no pós pandemia e foi o que mais aumentou no período, por ter preços menores em relação ao comércio formal.
A faxineira Maria do Rosário Ramos Silva, de 57 anos, por exemplo, tem como segunda fonte de renda vender salgados que prepara para os vizinhos. Ela tira um salário mínimo com as limpezas e ganha um extra com os quitutes. A coxinha custa R$ 2, bolinha de queijo e bolinho de carne saem por R$ 1. "O pessoal passa na minha casa, compra e leva para comer no trabalho ou à noite em casa e no lugar de uma refeição", conta.
As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.