Contribuição on-line já responde por metade da arrecadação; folhetos das missas pararam de ser impressos e migraram para o celular
Mexer no celular durante as missas deixou de ser um sinal de desatenção ou desrespeito com a celebração. Pelo contrário. É assim que muita gente acompanha cânticos e orações. O tradicional folheto de papel foi aposentado nas paróquias e digitalizado: pode ser escaneado com uso de um QR Code. Quando chega a hora da oferta, o fiel recorre ao mesmo sistema, que o direciona para a conta bancária do templo, possibilitando a doação por meio do Pix, cuja chave é informada em avisos colados nos bancos. Nos casamentos, a propósito, há a opção de a transmissão da cerimônia ser feita pelas redes sociais dos noivos, para que parentes e amigos distantes possam acompanhar de onde estiverem.
A modernidade passa a fazer parte de uma instituição secular, a Igreja Católica. A mudança começou na pandemia, com a necessidade de transmitir missas e evangelizar à distância. Algumas novidades deram tão certo que vieram para ficar. Na Igreja de Santana, por exemplo, as doações por Pix já respondem por 60% da arrecadação, segundo o padre Joel Fernandes Lopes, religioso mineiro na paróquia há pouco mais de dois anos.
— A tecnologia foi muito importante no tempo da pandemia. A era digital contribuiu para que as pessoas pudessem continuar tendo acesso à oração. É a forma de catequizar na modernidade. Hoje, até nossos encontros vocacionais são on-line. Temos duas reuniões presenciais, e o resto é à distância. A oferta por Pix foi implantada no ano passado, facilita a vida do fiel que não precisa andar com dinheiro e é boa para igreja, que não fica vulnerável aos assaltos — explica o padre Joel.
Entre os serviços que a Igreja de Santana oferece aos noivos, com a ajuda das novas tecnologias, está a possibilidade de transmitir a cerimônia de casamento diretamente nas redes sociais, arrebanhando mais parentes e amigos. Nesse caso, a pessoa só precisa permitir o acesso. Não há cobrança de taxa adicional, mas doações são bem-vindas e ajudam na manutenção do sistema, que foi montado durante a pandemia para transmissões das missas e é composto por duas webcams e um computador.
— Quando veio a pandemia, tivemos de nos adaptar na marra para transmitir as missas on-line. Começamos fazendo isso por celular mesmo e, depois, evoluímos para os equipamentos de que dispomos hoje — conta o sacristão Guilherme Correa, coordenador da Pastoral da Comunicação e responsável pela parte de informática da Igreja de Santana.
Durante uma missa celebrada na Igreja de São Francisco de Assis, no Rio Comprido, na última quarta-feira, a zeladora Mônica Ferreira, de 54 anos, na hora da oferta, sacou do celular da bolsa, apontou para o QR Code colado no encosto do banco à sua frente e fez a doação. Cartazes espalhados por todo o templo informam como acessar o folheto digital para acompanhar a celebração, também com a ajuda do celular.
— A doação por Pix abre a possibilidade de a gente dar uma ajuda mais generosa, sem precisar carregar dinheiro na bolsa. Também é a solução quando esquecemos a carteira em casa. Hoje, por exemplo, vim desprevenida e comprei umas fitinhas no débito. É prático (doar por Pix), facilita a vida da gente e ainda tem o fator segurança — aprova Mônica.
— Cada vez menos as pessoas carregam dinheiro consigo. Esse tipo de doação ainda é um percentual pequeno, porque temos muitos frequentadores idosos, mas os mais jovens aderiram. É uma modernidade que não tem mais volta — constata.
A digitalização dos folhetos tirou de circulação os 400 mil exemplares que eram impressos semanalmente e que, com a reutilização, atingiam até 1,8 milhão de fiéis. Hoje, a publicação pode ser baixada por meio de leitura do QR Code nas próprias igrejas ou pela página oficial e redes sociais da Arquidiocese do Rio, em versões para celular e tablet. A Igreja de São Basílio e Nossa Senhora do Perpétuo Socorro, no Centro, envia semanalmente a versão digital por WhatsApp para os fiéis cadastrados.
Popular entre todos os públicos, inclusive o idoso, esse aplicativo se tornou também um dos principais instrumentos de evangelização, segundo alguns padres. Virou ambiente propício para os tradicionais avisos paroquiais, que antes costumavam ser feitos aos fiéis no final das missas. A tecnologia facilita ainda a vida de padrinhos e noivos, que têm a opção de fazer os cursos de formação de maneira on-line. A igreja só não abre mão da forma presencial de sacramentos como batismo, eucaristia e casamento.
Com o amplo uso das tecnologias, ele acrescenta que a Arquidiocese do Rio foi a primeira do Brasil integrada na Lei Geral de Proteção de Dados. Padre Omar confirma que a doação por Pix é uma novidade que veio para ficar e já responde por cerca de 50% da arrecadação das igrejas. Ele é mais um que frisa as vantagens no sistema, como a redução de furtos aos fiéis e aos templos, com a diminuição da circulação de dinheiro em espécie.
O objetivo inicial era atender as pessoas que não queriam manusear cédulas e moedas, por medo do vírus da Covid-19. Agora, as novas tecnologias só não substituíram de vez a sacolinha por causa dos idosos que não têm muita intimidade com apps e afins e ainda são grande parte do público religioso, explica o Padre Arnaldo Rodrigues, assessor da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB).