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Mãe passa o dia dentro da sala de aula com o filho por falta de cuidadores em escolas no ES

A assistente fiscal Joice Gabriele da Rocha, de 38 anos, deixou o emprego para se dedicar à alfabetização do filho dentro da sala de aula. A realidade dela é parecida com a de outras mães da Grande Vitória.

Por Regional ES

27/02/2024 às 07:11:18 - Atualizado há
Mãe passa o dia dentro da sala de aula com o filho por falta de cuidadores em escolas no ES — Foto: Reprodução/TV Gazeta

Desde o início do ano letivo de 2024, a assistente fiscal Joice Gabriele da Rocha, de 38 anos, frequenta a Escola Municipal de Ensino Fundamental (EMF) João Pedro da Silva, localizada em Santana, Cariacica, na Grande Vitória. Apesar de já ter concluído o ensino superior, o motivo da frequência escolar é outro: devido à falta de cuidadores para alunos com necessidades especiais, a profissional deixou o trabalho de lado para acompanhar o próprio filho no processo de alfabetização, dentro da sala de aula.

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"Minha vida ficou de lado porque perdi meu emprego para poder ficar com meu filho. Todos os dias eu estou indo porque não tem ninguém para ficar com ele. Eu fico dentro da sala, faço os deveres com ele", disse a mãe.

O filho de Joice é o pequeno Enzo da Rocha Mantovani, de sete anos de idade. Em entrevista para o g1, a assistente fiscal disse que o menino foi diagnosticado com o espectro 2 de autismo aos dois anos de idade, acompanhado também de transtorno opositor desafiador (TOD) e de Transtorno do Déficit de Atenção com Hiperatividade (TDAH).

"Ele é uma criança hiperativa, que não faz as coisas sozinha, não vai ao banheiro sozinho. Não consegue fazer as atividades. Então, como não tem cuidador na escola, eu tenho que acompanhar. Ele tem tido várias crises por causa disso".

Joice disse ainda que já reclamou com a Prefeitura de Cariacica, responsável pela gestão da escola, algumas vezes, mas que a resposta sempre foi a de que "não havia previsão para a contratação de cuidadores".

Assista o vídeo: Falta cuidador para crianças com deficiência em Vila Velha e Cariacica

Questionada sobre o assunto, a administração municipal disse que todas as escolas contam com professor para crianças com necessidades especiais e que o número de docentes na mesma sala vai depender do grau de comprometimento de cada aluno.

A prefeitura também informou que a falta de profissionais ocorre apenas quando há desistência da ocupação da vaga e que as contratações são realizadas ao longo do ano, seja por causa do aumento de demanda, para substituição ou quando o profissional realmente desiste.

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Por último, a gestão disse que muitos alunos com necessidades especiais só se apresentaram após o carnaval de 2024 e que, assim que a demanda é identificada, é realizada a contratação dos profissionais, obedecendo prazos para a convocação e a classificação do processo seletivo.

Outros municípios enfrentam a mesma realidade

Pedro, de seis anos, não está frequentando as aulas por falta de cuidador — Foto: Reprodução/TV Gazeta

Pedro, de seis anos, não está frequentando as aulas por falta de cuidador — Foto: Reprodução/TV Gazeta

Uma dessas pessoas é a dona de casa Geani Lopes, mãe do Pedro, de seis anos de idade. O menino tem Síndrome de Down e TDAH e, de acordo com o laudo médico, precisa de acompanhante de forma integral para intermediar o aprendizado.

No entanto, segundo a mãe, Pedro não começou o ano letivo de forma efetiva devido à falta de cuidadores na Unidade Municipal de Ensino Fundamental Dijayro Gonçalves Lima, localizada no bairro Barramares.

"Eu chego na escola e não tem apoio, não tem cuidador para eles. Tem muita criança especial no turno da tarde. Tem três cuidadores para 10 a 15 alunos. Eu, como mãe, não me sinto segura de deixar Pedro na escola", disse Geani.


Ainda de acordo com a mãe, ela já entrou em contato com a prefeitura diversas vezes, mas sem resposta sobre a contratação de professores.

"Tá quase terminando o mês de fevereiro e ainda não tem um retorno deles. E ele precisa de ajuda para poder pegar um lápis, para escrever. No fim ano passado, quando eu peguei o caderno dele, eu chorei sozinha em casa, porque veio em branco. Não tinha nada", disse.

UMED Dijaro Gonçalves Lima, localizada em Vila Velha, no Espírito Santo — Foto: Reprodução/TV Gazeta

UMED Dijaro Gonçalves Lima, localizada em Vila Velha, no Espírito Santo — Foto: Reprodução/TV Gazeta

Questionada sobre a falta de professores para atender a alunos com necessidades especiais, a Secretaria de Educação de Vila Velha informou que realizou nova convocação de profissionais de educação especial (deficiência intelectual e múltipla) para ampliar a oferta de professores especializados no dia 20 de fevereiro.

A gestão disse ainda que, mesmo com a renovação de todos os contratos vigentes no final de 2023, o início do ano letivo é período de adequação do quadro profissional, em função de apresentação de novos laudos e também por solicitação de desligamento de alguns professores, além da avaliação das especificidades de cada caso pela equipe pedagógica.

O que diz a lei

Sala de aula da rede municipal — Foto: André Sobral/Prefeitura de Vitória

Sala de aula da rede municipal — Foto: André Sobral/Prefeitura de Vitória

De acordo com o defensor público Renzo Soares, existem duas legislações federais que tratam sobre a temática questionada pelas mães, que é a Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência e também a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional.

No entanto, segundo Renzo, que também é membro do Núcleo da Infância e Juventude da Defensoria Pública do Estado do Espírito Santo (DPES), tais legislações são genéricas na sua aplicabilidade, justamente porque não estabelecem quantidade mínima de profissionais para cada criança com necessidade especial.

"Quando falamos de pessoas com deficiência (PcD), estamos falando de vários tipos de deficiência, como a visual, sensorial, físicas, entre outras. Como as leis não tratam desse tipo de detalhamento de quanto professor ou profissional para cada aluno, cabem às redes estaduais e municipais chegar a esse tipo de detalhamento. Aqui no Espírito Santo, desconheço alguma rede municipal que tenha esse quantitativo de forma clara", explicou o defensor público.

O defensor destacou ainda que inciso I do artigo 58 da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional estabelece que "haverá, quando necessário, serviços de apoio especializado, na escola regular, para atender às peculiaridades da clientela de educação especial" sem especificar como seria este apoio garantido por lei.

Dessa forma, segundo Renzo, há diferenças nas funções entre o professor de educação especial, o estagiário e o cuidador.

"O professor de educação especial é um articulador do professor regente da sala de aula, que vai planejar as atividades para os alunos que demandam algum tipo de adaptação. Isso porque o objetivo dessas leis é a inclusão dessas crianças e adolescentes", disse o defensor.

Já o estagiário seria profissional para dar suporte às atividades pedagógicas desenvolvidos pelos alunos com necessidades especiais, como a compreensão dos textos, segundo o defensor.

"Os cuidadores, por sua vez, são pessoas que fazem o apoio mais físico a estes estudantes, seja para o aluno se locomover, cuidados de limpeza, higiene, alimentação, entre outros", completou Renzo.

Ainda de acordo com o defensor público, seria conveniente que cada estado e município definisse pelo menos o quantitativo mínimo desses profissionais para contribuir para a fiscalização desses direitos fundamentais.

"Isso daria mais segurança para todos. Os gestores conseguiriam se planejar, os pais teriam uma ideia do que poderia acontecer e também para o Ministério Público e as Defensorias Públicas, que são quem tem a função de assegurar os direitos de quem usa os serviços públicos", finalizou.
Fonte: G1
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