Quem acompanha a política sabe que, mal termina uma eleição e o mercado político já está discutindo a próxima. E isso acontece principalmente nas eleições municipais, quando boa parte dos acordos leva também em consideração as eleições gerais, que ocorrerão dois anos depois.
Por exemplo, um prefeito que irá tentar a reeleição neste ano e pretende disputar o governo do Estado em 2026, sabe que precisa escolher bem o seu vice, porque terá de renunciar no meio do mandato para a disputa ao governo e entregar a prefeitura para seu companheiro de chapa. E, sabendo disso, dependendo da prefeitura, a disputa pela vaga de vice será acirrada entre os partidos.
Outro: um político que tenha interesse em disputar uma cadeira de deputado federal daqui a dois anos, pode se lançar a prefeito nesse ano, mesmo sem chances reais de ganhar ou de ter uma candidatura competitiva, apenas para marcar posição e se tornar conhecido no eleitorado para seu objetivo real que é entrar na Câmara dos Deputados.
E assim por diante.
Mas, há quem negue, ao menos publicamente, essa predisposição e faça mistério sobre projetos futuros, ainda que o mercado político o pressione a se posicionar. Um desses casos é o do vice-governador do Estado, Ricardo Ferraço (MDB).
O vice é um dos principais cotados para ser o sucessor do governador Renato Casagrande (PSB), que não pode disputar a reeleição após dois mandatos consecutivos. A cotação não vem de agora. Quando Ricardo foi escolhido para ser vice na chapa à reeleição de Casagrande, esse foi um dos primeiros questionamentos que teve de enfrentar: se seria o sucessor do governador em 2026.
Um questionamento esperado até porque o vice se tornar candidato ao governo é um caminho natural. Mas não só por isso. Na época da escolha, em 2022, não faltaram lembranças e comparações com um outro período em que Ricardo foi vice (2006-2010) e que também havia uma expectativa/promessa de que ele seria o escolhido para a sucessão do então governador Paulo Hartung.
Uma possível escolha de Ricardo para a sucessão de Casagrande poderia ser vista como uma "reparação histórica" do episódio conhecido como "abril sangrento" de 2010, quando Ricardo foi rifado na sucessão de Hartung devido a uma costura nacional (geopolítica), que levou o então senador Renato Casagrande para o comando do Palácio Anchieta. Ricardo foi para o Senado.
Mas há outros sinais para essa cotação. Ao ser reeleito e definir seu primeiro escalão, Casagrande entregou para o vice o comando da Secretaria Estadual de Desenvolvimento e algumas outras missões, como cuidar de perto de questões envolvendo o Meio Ambiente e a Agricultura, além das negociações federais sobre a duplicação da BR-101 – de fundamental importância para o Estado.
Além de possuir a competência técnica para o cargo, não se pode negar que Ricardo Ferraço estar à frente desses postos é também uma forma de ter visibilidade, um holofote que, como vice, pouco teria.
Soma-se a isso o fato dele também ter assumido o comando estadual do MDB após, segundo informações apuradas nos bastidores, ter contado com uma "mãozinha" do Palácio Anchieta nas articulações.
E para quem tem projetos maiores para 2026, nada melhor que estar à frente de um partido de grande porte como o MDB – ainda que a legenda esteja saindo do fundo do poço – para pavimentar o próprio caminho – vide a disputa pelo comando do União Brasil.
Por isso, diante de todos esses sinais, a coluna De Olho no Poder questionou o vice sobre os projetos para 2026. Primeiro sobre os projetos do partido. Segundo ele, o MDB está focado no agora: disputar 2024, ser bem-sucedido e respeitar os aliados.
A coluna noticiou no último sábado que o MDB chega para as eleições com mais do que o dobro de chapas proporcionais se comparado à eleição de 2020. Aumentou também o número de prefeitos, de vices e vereadores, após o vice assumir o comando da legenda.
"Trabalhar o longo prazo na política é como enxugar gelo e cercar vento. Se você pergunta para as pessoas hoje em quem elas irão votar em outubro, as pesquisas mostram que as pessoas não sabem nem que tem eleição esse ano. O foco das pessoas é no dia a dia, nos seus problemas, então não dá para ficar projetando. Acho uma coisa sem propósito", disse Ricardo.
A coluna insistiu e perguntou ao vice-governador se ele confirmava o interesse em suceder Casagrande: "Absolutamente, não (confirmo). Acho completamente intempestivo e fora de propósito qualquer tipo de planejamento para 2026. Esse negócio de você disputar uma eleição e já pensar na outra, só enfraquece a política e os políticos. Parece que as pessoas só pensam em política, não pensam em trabalhar, em resolver os problemas das pessoas, em cuidar das pessoas. Política tem o tempo certo".
Sobre o mercado político cogitar o seu nome, Ricardo disse que não fez nenhum movimento para isso: "Eu não posso proibir (de cotarem seu nome), mas não há e não haverá um movimento da minha pessoa. Eu não fui eleito para disputar nada, eu fui eleito para poder corresponder a expectativa das pessoas, não tenho compromisso de disputar nada em 2026. Acho um despropósito essas ansiedades, essas precipitações. Na minha opinião, enfraquece o político diante da sociedade", avaliou.
Ele, porém, não descartou ser candidato. Ou seja, ele está no jogo, embora não queira admitir agora. Discernir o tempo certo de falar, na política, é uma estratégia para evitar queimar a largada e chegar desgastado quando a corrida realmente acontece. E a disputa pela sucessão de Casagrande promete ser acirrada, dentro e fora da base aliada.
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Em tempo: A coluna também questionou ao vice-governador Ricardo Ferraço se é pra valer a pré-candidatura do seu pai, o deputado estadual Theodorico Ferraço, que vai disputar a Prefeitura de Cachoeiro. "Não sei se ele é candidato. Sei que ele é pré-candidato e que está animadíssimo. Aliás, não sei de onde ele tira tanta energia", disse Ricardo, aos risos. Theodorico tem 86 anos.