Expressão na camiseta faz alusão à obra 'Seja marginal, Seja herói', de Hélio Oiticica. Professora diz que deputado compartilhou montagem de foto dela com a legenda falsa 'professora de história com look petista em sala de aula'.
Uma professora de história da arte, que preferiu não se identificar, foi demitida de uma escola após o deputado Gustavo Gayer (PL) criticá-la, por meio das redes sociais, por ela usar uma camiseta com a frase de um artista plástico renomado. A expressão na camiseta faz alusão à obra 'Seja marginal, Seja herói', de Hélio Oiticica (1937-1980), um dos mais importantes artistas brasileiros a partir de 1950 e que a professora frequentemente trabalha em sala de aula por ser tema de questões de vestibular.
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"Sempre uso camisetas com obras de arte. É um jeito que tenho para conversar sobre arte com os alunos, de forma despretenciosa. Naquele dia expliquei e eles entenderam o contexto histórico da obra", explicou a professora.
A professora contou que trabalhava no Colégio Expressão, localizado em Aparecida de Goiânia, na Região Metropolitana da capital, desde janeiro. O caso iniciou quando ela foi para a sala de aula com a camiseta pela primeira vez na terça-feira (2) e publicou uma foto com a blusa em seu Instagram. Ao g1, a professora contou que a demissão aconteceu por telefone, na quinta-feira (4), depois que o deputado fez a publicação de crítica.
Abalada com a situação, ela ainda detalhou que a postagem feita pelo parlamentar se tratava de uma montagem e contava com uma legenda falsa com os escritos "professora de história com look petista em sala de aula", que ela não havia escrito na publicação original.
"Minhas camisetas de obras de arte são feitas por um amigo e na foto eu literalmente só marquei a loja [para divulgação]. A obra é vermelha, por isso a camiseta é vermelha. Não há associação política alguma", explicou.
O g1 entrou em contato com o deputado em busca de um posicionamento sobre o caso e aguarda retorno. A reportagem entrou em contato com a escola por telefone na manhã deste sábado (6), em busca de um posicionamento, mas não obteve retorno. Em uma nota divulgada pela escola nas redes sociais, eles afirmam que "escola não é lugar de propagar ideologias políticas, religiosas ou preconceituosas" (veja nota completa ao final da reportagem).
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A professora ainda explicou que costuma ensinar sobre o artista plástico em sala de aula, por se tratar de um tema frequente em questões de vestibular, como em uma questão do vestibular da Universidade de Campinas (Unicamp), de 2022. Ela ainda explicou que sempre explica sobre as obras de arte e seus respectivos contextos históricos.
"Eles são adolescentes e têm bagagem para entender do que se trata", completou.
Após a publicação do deputado, que contou com a marcação insistente do nome do colégio em que a professora trabalhava, o caso repercutiu entre apoiadores e seguidores do parlamentar, que também passaram a pressionar a escola por meio das redes sociais. Segundo a professora, ela só soube que sua publicação inicial havia tomado tamanha proporção e que Gayer havia feito postagem sobre o caso quando recebeu uma ligação de um dos sócios da escola, na noite da terça-feira (2).
"Recebi uma ligação dizendo que eu tinha causado muita dor de cabeça com uma foto que tinhha postado. O tom da escola foi de me culpabilizar por isso, quando, na verdade, fui vítima do caso", lamentou a professora.
Ela contou que, no dia seguinte, a escola a convocou para uma reunião e, ao final, ficou acordado de que eles tentariam entrar em um acordo para resolver a situação. Já na quinta-feira, ela recebeu a ligação em que foi demitida.
A professora também revela que a informação de que ela havia sido demitida foi publicada por Gustavo Gayer nas redes sociais dele, em tom de comemoração, antes mesmo de ser dita a ela por parte da escola.
"Fiquei muito abalada psicologicamente, com medo de isso afetar minha carreira", desabafou.
De acordo com o advogado da professora, Alexandre Amui, ela entrou com uma ação contra o deputado onde pediu a exclusão dos vídeos, proibição de novas postagens, direito de resposta e dano moral. O advogado ainda diz que deve ajuizar uma ação trabalhista contra a escola.
Ao g1, o Sindicato dos Professores do Estado de Goiás (Sinpro Goiás) repudiou a atitude do deputado e afirmou que entrou com uma ação contra o parlamentar na Justiça Federal, solicitando a exclusão das redes sociais disseminadoras de ódio e falsas notícias, incluindo que a página dele "persegue professores em nome do monitoramento da suposta doutrinação" (veja a nota completa ao final da reportagem).
Nota divulgada pela escola na íntegra:
O Colégio Expressão e o Colégio Expressão Jr. têm o compromisso de oferecer uma educação de qualidade, pautada pela ética, respeito e diversidade. Por mais de 23 anos, nossa escola jamais induziu, militou ou abordou temas políticos, religiosos ou de gênero, pois acreditamos que essas escolhas devem ser respeitadas e discutidas no âmbito familiar.
Nossa missão é proporcionar aos nossos alunos uma formação integral, que prepare não apenas para o ingresso no mercado de trabalho, mas também para a construção de uma sociedade mais justa e democrática. Para isso, trabalhamos com um conteúdo pedagógico atualizado e alinhado com as exigências do Enem.
Ensinar conteúdos polêmicos em sala de aula pode ser um desafio para nós educadores. Porém, como profissionais da educação, temos a responsabilidade de apresentar esses temas de forma imparcial e crítica, sem tomar partido ou influenciar nossos alunos. É importante destacar que a escola não é lugar de propagar ideologias politicas, religiosas ou preconceituosas. Nossa missão é formar cidadãos conscientes e éticos, capazes de compreender e respeitar as diferenças culturais e ideológicas.
Reconhecemos que essa é uma tarefa complexa, mas estamos comprometidos em buscar constantemente o aprimoramento para oferecer um ensino de qualidade.
"O Sindicato dos Professores do Estado de Goiás, Sinpro Goiás, além de repudiar com veemência a atitude covarde e irresponsável do dep. Gustavo Gayer, informa que entrou com uma ação na Justiça Federal contra ele, assinada também pelo Sintego, Fitrae-BC e Contee, solicitando a exclusão das redes sociais disseminadoras de ódio e falsas notícias, incluindo-se a página dele que persegue professores/as em nome do monitoramento da suposta doutrinação.
O Sindicato dos Professores do Estado de Goiás está dando todo o suporte à docente e entende que o ataque covarde contra ela, protagonizado por esse ignóbil deputado, arquitetado na base da fake news, que distorce o objeto em estudo que é a cultura marginal no Brasil traduzida na resistência do povo excluído contra a opressão, é um ataque a todos os professores e professoras. É um ataque à educação e à sociedade como um todo.
O Sinpro Goiás informa também que já realizou representações contra Gustavo Gayer no Ministério Público de Goiás e Federal. O Sinpro, que completa 60 anos de história, seguirá firme e vigilante, pronto a defender os professores e as professoras com toda a força da sua representação e da lei."