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Servidora de Fundão é afastada por suspeita de propina e fraude em contrato

Anitha Cristina Souza e o motorista de uma empresa terceirizada são suspeitos de fraudar contratos do programa de limpeza de fossas do município

Por Regional ES

15/11/2022 às 18:54:23 - Atualizado há
Fundão: suspeitos teriam participado de esquema de propina que envolve o sistema de limpeza de fossas da cidade. (Denis Rizzoli/Divulgação)

Uma servidora da Prefeitura de Fundão e um funcionário de uma empresa terceirizada viraram alvos de um processo do Ministério Público do Espírito Santo (MPES). Anitha Cristina Souza Martins, que foi afastada do cargo, e o motorista Edilson Mathias Barbosa são suspeitos de participarem de um esquema de propina que envolve o sistema de limpeza de fossas do município.

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De acordo com o órgão, a ação criminosa consistia em uma fraude na execução de contrato de serviço de esgotamento sanitário firmado entre a administração municipal e a empresa HFF Transportes Ltda ME, onde Edilson trabalhava. A mulher era a pessoa responsável pelo programa e coordenadora da unidade administrativa de Praia Grande.

O caso foi descoberto após depoimentos de dois vereadores da cidade, que receberam denúncias de populares acerca de irregularidades envolvendo o caminhão fossa contratado. Eles chegaram a levantar informações que davam fortes indicativos do crime, o que motivou a investigação do MPES.

Como o esquema funcionava

Segundo apurado pelo MPES, a Prefeitura de Fundão, desde 2021, executa um "programa de limpeza de fossas sépticas ou similares em propriedades particulares, mediante o pagamento de tarifa para compartilhamento de custos de manutenção do serviço". Esse valor gira em torno de R$ 200 a R$ 250. Para as pessoas consideradas em situação de vulnerabilidade social, é prevista a isenção de tarifa, desde que preenchidos determinados requisitos.

No entanto, ao invés de orientar a população acerca dos trâmites legais, ao ser questionada sobre o serviço, Anitha Cristina estaria pedindo para que os munícipes entrassem em contato diretamente com o motorista.

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Quando isso acontecia, de acordo com o órgão, Edilson solicitava o pagamento indevido de R$ 300, dando, assim, preferência na fila de atendimento. Desse total, apenas R$ 100 ficavam com ele, e o restante era repassado para a coordenadora.

"Para acobertar o esquema, segundo consta, os investigados incluem e atestam falsamente os serviços prestados 'por fora' na lista de pessoas com direito à isenção de tarifa, fazendo com que a empresa receba pela fossa coletada por meio dos pagamentos efetivados pela Prefeitura Municipal de Fundão, causando prejuízo ao erário (os dinheiros e bens da cidade), além de revelar enriquecimento ilícito", afirma a denúncia da entidade estadual.

Caminhão sem identificação

Entre os indícios apresentados pelo MPES, está a falta de identificação do caminhão utilizado para o serviço. Foi possível constatar, por meio de registros fotográficos, que o veículo possuía apenas registro da empresa proprietária, "o que é irregular, uma vez que o contrato administrativo vigente, em sua cláusula 8.11, é expresso ao exigir a colocação de dois adesivos, um de cada lado do veículo, com logotipo e os dizeres: 'A SERVIÇO DO PMF – SESIM'".

Segundo MPES, caminhão utilizado para o serviço não teria identificação para facilitar a ação criminosa
Segundo MPES, caminhão utilizado para o serviço não teria identificação para facilitar a ação criminosa. (MPES)

Conforme o promotor Egino Gomes Rios da Silva, que elaborou a denúncia, a ausência de identificação do caminhão permite o acobertamento da prática ilícita, além de dificultar a fiscalização por parte dos entes competentes.

Denúncia anônima

Durante as investigações, o MPES recebeu ainda uma denúncia anônima com diferentes materiais que incriminam os suspeitos, desde fotografias até áudios. Há registros em imagens de supostas quantias recebidas pelos investigados, inclusive com o nome da servidora pública ao lado da palavra "propina".

"Propina": dinheiro associado ao nome da servidora . (MPES)

Também foram apresentados materiais de possíveis conversas entre os dois investigados, nos quais são feitas negociações acerca dos próximos serviços de fossa e a divisão dos "lucros". Em um dos áudios atribuídos à coordenadora, ela ainda afirma que o cartão de crédito está estourado e que, por isso, precisaria do dinheiro (veja abaixo):

Transcrição dos áudios

"Tô vendo aqui se eu... uma pessoa ligou aqui e eu até já passei seu contato para te ligar aí... vamos ver se a gente consegue essa semana ou a outra semana fazer umas fossas aí";

"Hein.... tô precisando de um favor seu... vamos negociar um negócio aqui eu e vc... aqui é porque meu cartão tá estourado, então não posso comprar nem nesse mês nem no outro.... tô precisando passar trezentos reais no cartão... aí caso a gente consiga alguma coisa já, você já pode até pegar o dinheiro e descontar, mas por via das dúvidas a gente... eu te pago na parcela do mês... mas se você fizer umas duas... se a gente conseguir umas três fossas aí, a segunda e a terceira você já pode descontar e pegar o dinheiro... vamos fazer um negócio desse aí, topa? tô precisando passar trezentos";

"Não meu anjo, eu não tô pedindo em espécie. Eu tô vendo se existe uma possibilidade de você passar para mim o cartão de trezentos... aí caso a gente nas nossas negociações... a gente faça alguma coisa, você já pode retirar esse valor, entendeu? não é espécie não".


Depoimento de vereador

Reforçando as suspeitas do MPES, um dos vereadores que prestaram depoimento relatou que foi procurado há pouco tempo por Anitha Cristina Souza Martins, que externou interesse em adquirir um lote e construir uma casa. Segundo ele, a servidora teria afirmado que o processo seria "sem burocracia" e que "iria fazer rir" com o negócio.

"A abordagem causou estranheza, uma vez que a investigada, que é pessoa conhecida na região de Praia Grande, não aparenta dispor de condições financeiras de contratar uma empreitada em tais termos, dando a entender que está de posse de dinheiro de origem ilícita", apontou o MPES.

Transações volumosas

Além disso, em planilhas oficiais disponibilizadas no Portal da Transparência, o MPES identificou que, entre janeiro e setembro de 2022, foram empenhados, liquidados e pagos, em favor da empresa HFF Transportes Ltda ME, respectivamente, R$ 488.562,71, R$ 402.920,58 e R$ 293.884,13.

"Salta aos olhos que, no curto período em referência (cerca de nove meses do ano de 2022), após a edição e regulamentação de novo marco legal sobre o tema, o programa de esgotamento de fossa vem sendo prestado de forma recorrente e crescente, chegando a atingir a cifra de meio milhão de reais, possibilitando que os investigados operam o esquema ilícito e se locupletem (enriqueçam) indevidamente, em prejuízo ao erário".

Segundo o promotor Egino Gomes Rios, existem indícios dos crimes de peculato, corrupção passiva e fraude em licitação e contrato. Ele afirmou ainda que os fatos revelam atos "graves" e atentam contra os princípios "da (boa) Administração Pública".


Decisão

Com essas evidências em mãos, o MPES pediu a prisão preventiva de Anitha Cristina Souza Martins e Edilson Mathias Barbosa. Contudo, o juiz Alcemir dos Santos Pimentel, que julgou o processo, entendeu que não havia elementos suficientes para isso.

Na decisão, o magistrado também deferiu o pedido de afastamento da servidora e do cancelamento do contrato entre a Prefeitura de Fundão e a empresa HFF Transportes Ltda ME. Determinou ainda um pedido de busca e apreensão domiciliar tanto na residência da mulher quanto do motorista, além de cortar o sigilo dos dados contidos nos aparelhos eletrônicos dos dois.

Em nota, a Prefeitura de Fundão informou que assim que tomou conhecimento da suposta prática comunicou ao MPES e abriu procedimento para apurar a responsabilidade da servidora e eventuais valores a serem ressarcidos aos cofres público. A administração municipal disse ainda que a servidora investigada foi exonerada do cargo que ocupava.

"O Município de Fundão, na qualidade de vítima do suposto crime praticado, tem contribuído com as autoridades investigativas e confia na resolução do caso o mais breve possível, aos mesmo tempo em que lamenta a exploração política do caso, mediante a veiculação de fake news nas redes sociais", informou a prefeitura.

A reportagem tenta contato com a defesa dos suspeitos e a empresa terceirizada para mais esclarecimentos. Assim que houver retorno, este texto será atualizado.

Fonte: Gazeta Online
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